sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Mortos na tortura da Ditadura Militar.


Li um livro interessante chamado Direito à Memória e à Verdade: comissão especial sobre mortos e desaparecidos políticos. Esse livro é uma publicação da Secretaria da Presidência da República (2007).

O livro trata sobre a tortura no período da Ditadura militar no Brasil (1964 - 1985) e tem também biografia de alguns dos mortos por época histórica.

Fiz uma procura entre os mortos e destaco duas aqui: um de Limeira e um estudante da ESALQ-USP, escola onde me graduei.

É chocante e irônica a forma pela qual a polícia oficializou a morte do estudante esalqueano.

ANTÔNIO HERNANDES (1922 – 1974)
Número do processo: 305/96
Data e local de nascimento: 21/12/1922, Limeira (SP)
Filiação: Maria Thomé e Tiburcio Ernandez
Organização política ou atividade: trabalhador rural
Data e local do desaparecimento: 23/01/1974, São Paulo (SP)
Relator: João Grandino Rodas
Indeferido em: 17/10/1996

Hernandes era diretor de uma Associação dos Lavradores e Trabalhadores Rurais de São Paulo, em 1963, segundo um documento do DOPS/SP anexado ao processo formado junto à CEMDP. Não foi apresentada, no entanto, nenhuma prova, ou qualquer outro documento que traga informações sobre seu desaparecimento, ou atestando que o eventual desaparecimento teve motivação política. A falta de documentação fez com que a CEMDP indeferisse o processo.


LUIZ HIRATA (1944-1971)
Número do processo: 290/96
Filiação: Hisae Hirata e Tadayoshi Hirata
Data e local de nascimento: 23/11/1944, Guaiçara (SP)
Organização política ou atividade: AP
Data e local da morte: 20/12/1971, São Paulo (SP)
Relator: general Oswaldo Pereira Gomes
Deferido em: 14/05/1996 por unanimidade
Data da publicação no DOU: 17/05/1996.

Filho de imigrantes japoneses e agricultores, paulista de Guaiçara, na região de Lins, Luiz Hirata estudava Agronomia na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP, em Piracicaba. Em 1969 precisou abandonar os estudos, no quarto ano, por perseguição política: era militante da Ação Popular. Em 1971, antes de ser preso e assassinado sob torturas, era um dos cinco coordenadores do movimento de oposição sindical metalúrgica de São Paulo, ao lado de Waldemar Rossi, Cleodon Silva, Vito Gianotti e Raimundo Moreira.

Foi preso pela equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury, do DOPS-SP, em 26/11/1971. Morreu em 20/12/1971 como conseqüência das torturas a que foi submetido ao longo de três semanas. Heládio José de Campos Leme, preso político no DOPS/SP, conviveu ali com Luiz Hirata cerca de duas semanas. Ficaram na mesma cela. Acompanhou, dia a dia, o agravamento do seu estado de saúde, testemunhando que ele voltava dos interrogatórios carregado pelos policiais. Era Heládio quem carregava Luiz até o sanitário da cela. “Seu rosto ficou tão inchado que ele não podia abrir os olhos. Chegou um momento em que ele não mais urinava nem comia: foi quando o levaram, quase inconsciente”.

Em 16 de dezembro, quatro dias antes da morte, Fleury tentou justificar as lesões provocadas pelas torturas. Para isso, chamou ao DOPS o legista Harry Shibata, que se tornaria tristemente célebre a partir de 1975 por assinar o laudo que tentou legitimar a farsa do pretenso suicídio de Vladimir Herzog no DOI-CODI/SP. Prontamente, Shibata atendeu ao pedido e produziu um laudo de corpo de delito onde sustenta a estapafúrdia versão que lhe foi ditada pelo delegado torturador: Luiz Hirata havia colidido com a traseira de um ônibus quando tentava a fuga, em alta velocidade, correndo a pé. O legista considerou, então, “de bom alvitre remoção ao Hospital das Clínicas para socorro e providências médicas”.

Pode-se imaginar o estado físico em que se encontrava Luiz Hirata, a ponto de suscitar uma justificativa tão inverossímil como essa: Luiz Hirata teria simplesmente atropelado um ônibus ao tentar fugir. O laudo com as recomendações do legista Harry Shibata foi laborado às 9h15, mas Fleury levou o preso ao Hospital das Clínicas somente 11 horas depois. De acordo com a documentação oficial, Luiz Hirata morreu nesse hospital no dia 20. A requisição de exame ao IML, assinada por Jair Romeu, estava marcada com o “T” característico utilizado para identificar os presos políticos. Registra que teria morrido por morte natural, sendo diagnosticada insuficiência renal crônica. Os legistas Onildo B. Rogano e Abeylard de Queiroz Orsini confirmaram a versão oficial, embora façam referência à presença de “lesões não recentes” no corpo.

Esse segundo médico legista, Abeylard de Queiroz Orsini, teve cassado o exercício da profissão pelo Conselho Federal de Medicina, em 10/04/2002, confirmando decisão anterior do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, que havia proferido igual sentença em 29/04/2000, por violação da ética médica, fraude e conivência com a tortura ao assinar aproximadamente 15 laudos de presos políticos executados nos porões dos órgãos de segurança do regime militar.

No voto aprovado por unanimidade na CEMDP, o relator do caso, general Oswaldo Pereira Gomes, destacou que “as peças do processo dão a plena convicção de que Luiz Hirata estava preso na polícia paulista e que foi conduzido ao Hospital das Clínicas em estado terminal irreversível. Do processo consta declaração do professor Universitário Heládio Jose de Campos Leme, companheiro de prisão de Luiz Hirata que testemunharia a progressiva deterioração do estado físico dele em conseqüência de maus-tratos; depois das sessões de ‘interrogatório’, era trazido carregado pela polícia; que apresentava grandes hematomas pelo corpo, principalmente na região dos rins, diz essa testemunha que Hirata precisava ser carregado para fazer uso de vaso sanitário; após alguns dias foi retirado da cela semi-inconsciente para ser encaminhado a um Hospital”. E, categoricamente, afirmou: “Isto não coincide com a versão da fuga velocíssima da vitima que em velocidade chocou-se com a traseira de um ônibus”.


Observação: tenho uma cópia em pdf do livro. Quem quiser a cópia entre em contato comigo.

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